PARÁ: PCC e outras facções comandam o "narcogarimpo" na Amazônia


O Estado de S. Paulo

Relatório Mundial sobre Drogas 2023, publicado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, aponta o avanço do narcotráfico nos crimes ambientais na Amazônia Legal, com a ocupação irregular de terras, extração de madeira e garimpo clandestino, informa Ítalo Lo Re. 

A situação tem relação direta com a atuação, na Região Norte, de facções como o Primeiro Comando da Capital (PCC), de SP, e o Comando Vermelho (CV), do RJ, além de diversos outros grupos criminosos do Brasil e de outros países. O domínio das rotas para escoar drogas permite aos grupos criminosos investir também na exploração de recursos naturais – narcogarimpo – e na cobrança de taxas. A ONU inclui pela primeira vez um capítulo para tratar da criminalidade na Amazônia.
No Pará, as facções que comandam o narcogarimpo são: Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho (CV), Comando Classe A (CCA), Família do Norte (FDN) e Bonde dos 40. 

O narcotráfico tem impulsionado os crimes ambientais na Amazônia Legal, com a ocupação irregular de terras, extração de madeira e garimpo ilegal. A situação tem relação direta com o avanço de facções pelo Norte do País, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV). 

O domínio das rotas para escoar drogas permite aos criminosos investir na exploração de recursos naturais e na cobrança de taxas. A conclusão é do Relatório Mundial sobre Drogas 2023 do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC, na sigla em inglês). É a primeira vez que se inclui um capítulo específico de Amazônia.

Segundo o relatório da ONU, plantações de coca em países como Bolívia e Peru são vistas como de “impacto mínimo” em relação ao desmate. O problema está na “economia da droga”, que envolve a mineração irregular, a principal origem do mercúrio que polui os rios, além da grilagem de terra e abertura de estradas clandestinas, que contribuem para a derrubada de árvores. O Comando Vermelho, segundo o documento, vem estendendo há alguns anos suas operações de garimpo para a região de Madre de Deus, no Peru. E o CV ainda é visto como a facção de maior poder no Norte.

Ao mesmo tempo, grupos como o PCC “se infiltraram em múltiplas operações de mineração ilegal, oferecendo ‘proteção’, extorquindo ‘impostos’ e controlando poços e máquinas de dragagem”. Como o Estadão mostrou, a facção atua como “síndica” do garimpo no Território Yanômami, em Roraima, onde o governo decretou emergência de saúde. Ao menos desde 2019, garimpeiros passaram a carregar fuzis, e não mais armas de caça, e mudaram até como se vestem, com o uso de roupas pretas, diz relatório da Hutukara Associação, Associação Wanasseduume Ye’kwana e Instituto Socioambiental (ISA).

DINÂMICA 

Pesquisador da Universidade do Estado do Pará (UEPA), Aiala Colares Couto afirma que essa é uma “dinâmica recente”, impulsionada pela fuga, há alguns anos, de integrantes do PCC do sistema prisional em Roraima. “O garimpo tornou-se área de refúgio e os criminosos foram estabelecendo relações de poder, conquistando territórios e impondo uma lógica de controle sobre a organização das áreas de extração de ouro”, afirma o integrante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “É a origem do ‘narcogarimpo’.”

A sobreposição de crimes, segundo Couto, passou a ser “regra básica”, criando alianças com outras redes criminosas ou praticando outros delitos ambientais. Trecho do relatório aponta que “a expansão de fronteiras agrícolas, pecuária, mineração, estradas, esquemas de desenvolvimento urbano e energético, deslocamento e migração impulsionados pela economia das drogas são covariáveis potencialmente mais fortes que contribuem para o desmatamento”. Desse modo, há “claros efeitos indiretos gerados pela economia das drogas” sentidos na região.

Coordenador do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado do Ministério Público do Acre (MPAC), o promotor de Justiça Bernardo Albano afirma que as sobreposições de crimes ocorrem de forma distinta nos Estados e mais frequentemente em Amazonas e Rondônia. Ainda assim, reforça que há na Região Amazônica “atuação beligerante” do crime organizado para a tomada da cadeia logística para o narcotráfico. “Uma vez que eles têm cadeia logística para o escoamento de entorpecentes, passam a escoar por esse mesmo caminho outro tipo de ilícito – contrabando, mineração ou até o tráfico de pessoas. É domínio das rotas que ainda permite cobrar taxas.”

EMULAÇÃO

Pesquisadores afirmam que o Norte tem passado a, cada vez mais, emular práticas do crime organizado observadas no Sudeste. Anteontem, o Ministério Público do Pará deflagrou uma operação com o objetivo de cumprir mandados de busca e apreensão em casas de quatro suspeitos de integrar a “Sintonia dos Gravatas”, ala de advogados do PCC. “Encontramos 1.153 bilhetes e cartas de integrantes do PCC a quem esses advogados faziam entregas”, diz a promotora Ana Maria Magalhães de Carvalho. Segundo ela, os suspeitos estão diretamente conectados a líderes da capital paulista. “É o mesmo PCC de São Paulo: é tão organizado quanto.”

Segundo o relatório da ONU, crimes vistos como convergentes, de esquemas de proteção e extorsão a lavagem de dinheiro e corrupção, tornaram sobretudo as fronteiras entre Brasil, Colômbia e Peru um ponto violento, com diversos grupos envolvidos simultaneamente no tráfico de cocaína e na exploração de recursos naturais. Um deles é o Comando Classe A, a quem o PCC se aliou para tentar fazer frente ao CV na Região Norte. Como consequência das disputas de forças, povos indígenas e outras minorias também são desproporcionalmente afetados.
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Pesquisadores afirmam que o Norte tem passado a emular práticas do crime observadas no Sudeste

Isso porque sofrem deslocamento forçado, envenenamento por mercúrio e outros impactos relacionados à saúde.

Além disso, existe o aumento da exposição à violência e à vitimização, em alta em regiões como Altamira, no Pará. Segundo a edição mais recente do Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ainda que os homicídios estejam apresentando queda no País, em 2021 a taxa de mortes violentas intencionais foi de 30,9 (a cada 100 mil habitantes) na Amazônia Legal. O índice está bem acima da média nacional (de 22,3).



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